quinta-feira, 5 de maio de 2011

A transformação das mentalidades

 Com a acentuada e crescente decadência moral dos últimos tempos, paulatinamente vão se transformando as mentalidades, e passam a vigorar novas normas, insurgindo-se contra as eternas estabelecidas por Deus. Dando largas às suas paixões e vícios, numa progressiva via de deterioração dos princípios morais mais profundos, os homens contemporâneos chegam a dizer “em seus corações: o Senhor não faz bem, nem mal”; e acabam por eleger para si máximas relaxadas de vida: “Tudo é permitido... É proibido proibir”.
Ora, se nós abrirmos os Evangelhos, constataremos que não foi essa a conduta de Jesus e nem sequer por aí rumaram seus conselhos. Muito pelo contrário, o Divino Mestre afirmou: “Seja a vossa linguagem ‘sim, sim, não, não’.”
Jesus foi pedra de escândalo
Durante sua vida pública, Cristo dividiu os campos entre o bem e o mal, a verdade e o erro, o belo e o feio. Assim o mostrou, por exemplo, São Beda, o Venerável, ao afirmar: “Quando Jesus pregava e prodigalizava seus milagres, as multidões eram tomadas pelo temor e glorificavam o Deus de Israel; mas os fariseus e escribas acolhiam com palavras carregadas de ódio todos os ditos que procediam dos lábios do Senhor, como também as obras que realizava.”
Já ao ser o Menino Deus apresentado no Templo, Maria ouviu de Simeão estas palavras: “Eis que ele está posto para ruína e ressurreição de muitos em Israel, e para ser alvo de contradição.” O fato de Jesus ter sido pedra de escândalo é uma das causas de O terem odiado e de O tratarem como o Homem mais rejeitado da História. Esse escândalo deu-se, sinteticamente, por três razões.
1.       Por sua humildade e grandeza. A Pessoa Divina de Jesus une em si dois extremos opostos: a humildade e a grandeza.
Que o Messias nascesse em uma gruta, talvez ainda fosse aceitável para o orgulho humano, mas morrer na cruz... Era levar esta virtude até limites inconcebíveis.
De outro lado, Cristo, de dentro de sua inferior condição humana, demonstrou seu domínio sobre as enfermidades e a própria morte, sobre os mares, os ventos e as tempestades, causando espanto até aos seus mais íntimos.
É-nos fácil compreender a humildade, mas vê-la harmonicamente subsistir com a grandeza, num mesmo ser, choca nossa débil inteligência. Entretanto, Jesus nos chama à prática dessas virtudes opostas: por um lado, estarmos convictos de nossa contingência; por outro, vivermos na plena compenetração de sermos, pelo Batismo, filhos de Deus.
2.       Jesus, ademais, escandalizou por sua doutrina. Não só por expô-la com clareza e integridade totais, mas por ser Ele a própria Verdade em substância: “Eu sou o caminho, a verdade e a vida; ninguém vem ao Pai senão por mim.” Não é difícil compreender o espanto de muitos ao ouvir o filho do carpinteiro dizer isto!
Como afirma Donoso Cortés, célebre escritor do século XIX, o homem aceita verdades, mas tem dificuldade em admitir a Verdade. A acirrada polêmica de Jesus com os fariseus tinha em seu cerne essa problemática: apontava o Divino Mestre para o grave dever moral de adequar a vida e os costumes à lei de Deus. Mas, sobretudo, convidava seus ouvintes a aceitá-Lo como fonte e substância de tudo aquilo que pregava.
Os fariseus eram hipócritas, condutores cegos, serpentes, raça de víboras, etc., e em seu orgulho estavam resolvidos a nunca aceitar a Verdade. Daí a perseguição até a morte, movida por eles contra o Verbo Encarnado.
3.       Por fim, Jesus escandalizou por sua santidade: “A condenação está nisto: A luz veio ao mundo, e os homens amaram mais as trevas do que a luz, porque as suas obras são más. Porque todo aquele que faz o mal, aborrece a luz e não se chega para a luz, a fim de que não sejam reprovadas as suas obras.”
Ainda hoje — e assim será até o dia do Juízo — o pecador, em sua concupiscência, tem horror ao justo pois, à luz da vida deste, dá-se conta da maldade e feiúra do vício que abraçou, e não querendo abandoná-lo, procura destruir, ou denegrir o símbolo que o censura. A verdadeira santidade consiste em conhecer a Verdade, amá-la e praticá-la, ainda que isto possa levantar incompreensões e até rejeição. Disto Ele nos deu pungente exemplo no consummatum est, do alto da Cruz: de sinal de escárnio e de ignomínia, ela foi transformada pelo Redentor em trono de honra, poder e glória.