sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Sol entre duas fornalhas

Todo sacerdote é, conforme nos ensina São Paulo, “escolhido entre os homens e constituído a favor dos homens como mediador nas coisas que dizem respeito a Deus” (Hb 5, 1). Ele é, portanto, e antes de mais nada, um homem que comparte a mesma sina de todos os demais filhos de Adão e Eva, carregando defeitos e qualidades, e tendo na sua frente uma estrada de luta na qual se misturam tristezas e alegrias. Contudo, ao ser chamado por Cristo para ser seu ministro, deixa de ser um homem comum: ele passa a ser aquele sobre quem a mão de Deus pousou.
Confiscado por Deus para servi-Lo com exclusividade numa condição excelsa, o sacerdote se vê, contudo, muitas vezes assediado pelas preocupações do mundo. Constituído “como mediador nas coisas que dizem respeito a Deus”, é frequentemente tentado de cuidar de outros afazeres, como Marta, à qual, entretanto, Nosso Senhor recordou: “uma só coisa é necessária” (Lc 10, 42). Isto será tanto mais verdade para quem livremente escolheu colocar a mão no arado (cf. Lc 9, 62).
Pela imposição das mãos, o presbítero é consagrado ao serviço do Senhor. Torna-se pessoa sagrada, ministro de um culto sagrado, visando um fim sagrado. Isto exige dele ter, a partir daquele momento, “um coração totalmente entregue ao Senhor” (Card. Franc Rodé, Homilia, 22/8/2014). Obriga-o também a renunciar a tudo quanto seja profano e possa afastá-lo do sagrado.
Instrumento puríssimo do amor divino, o sacerdote tem como missão essencial incendiar as almas com o fervor por Deus, para multiplicar e expandir o fogo sublime que o próprio Cristo veio trazer à Terra (cf. Lc 12, 49), com o preço de seu Sangue; aquele fogo belíssimo que desceu sobre Maria e os Apóstolos (cf. At 2, 3).
Contudo, o mesmo Cristo que promete as maiores recompensas para os fiéis, não deixa de ameaçar as “árvores que não produzirem bons frutos” (Lc 3, 9; Mt 3, 10) com um “fogo que nunca se apaga” (Mc 9, 46). O sacerdote é colocado assim, numa perspectiva que transcende largamente sua natureza humana, entre duas fornalhas eternas: uma toda feita de amor, outra alimentada pela Justiça Divina.
Mas a santidade própria ao estado sacerdotal não se esteia no desejo de servir a Deus por temor ao inferno. O ministro consagrado deve abrasar-se de uma caridade intensíssima que o consuma, diante da qual nenhum sacrifício, nenhuma renúncia, nenhum holocausto pareçam excessivos. Chamado a ser “luz do mundo” (Mt 5, 14), o sacerdote tem o dever de converter-se num sol a iluminar e aquecer a Terra com o ardor de seu amor a Deus.

Se o católico ideal é um homem de fogo, o sacerdote só será digno de sua altíssima condição se ele tiver uma alma incendiada em amor. Se ele for um homem em cujas veias não circula sangue, mas fervor em brasas.