A ambição é uma paixão tão universal quanto o é a vida humana. Quase se
poderia dizer que ela se instala na alma antes mesmo do uso da razão, sendo
facilmente discernível no modo de a criança agarrar seu brinquedo ou na ânsia
de ser protegida. Ao tomar consciência de si e das coisas, os impulsos
primeiros de seu ser convidá-la-ão a chamar a atenção sobre sua pessoa e, se
ela cede, ter-se-á iniciado o processo da ambição. O desejo de ser conhecida e estimada é a primeira paixão que macula a inocência
batismal. Quantos de nós não nos lançamos nos abismos da ambição, da inveja e
da cobiça já nos primeiros anos de nossa infância? Essas provavelmente foram as
raízes dos ressentimentos que tenhamos tido a propósito da glória dos outros.
Sim, pelo fato de desejarmos a estima de todos, por nos crermos no direito à
glória e ao louvor dos nossos circunstantes, constitui para nós uma ofensa o
sucesso dos outros. Por isso São Tomás define a inveja como sendo "a tristeza do bem alheio enquanto se considera como mal
próprio, porque diminui a própria glória ou excelência" (1).
Há paixões que se mantêm letárgicas até a
adolescência, assim não o é a inveja; ela se manifesta já na infância e
acompanha o homem até a hora de sua morte. Não será difícil aos pais observar
os sinais desse vício, em seus pequenos. Irmãos ou irmãs, entre si, não poucas
vezes terão problemas por se imaginarem eclipsados pelas qualidades ou
privilégios de seus mais próximos. Quantas vezes não acontece de ser necessário
separar-se irmãos, ou irmãs, na tentativa de corrigir essas rivalidades que
podem chegar a extremos inimagináveis, tal qual se deu entre os primeiros
filhos de Eva, Caim e Abel?
A ambição e a inveja são mais universais do que
parece à primeira vista; poucos se vêem livres de suas garras. Elas se levantam
e tomam corpo em relação aos que nos são mais próximos, como afirma São
Tomás: "A inveja é do bem alheio enquanto diminui o nosso. Portanto,
somente se suscita a respeito daqueles que se quer igualar ou superar. Isto não
sucede em pessoas que diferem muito de nós em tempo, espaço e lugar, senão nas
que nos estão próximas" (2).
Assim, ao sábio será mais difícil invejar o
general, e vice- versa, ou, uma médica a uma costureira; mas dentro da mesma
profissão, quanto mais relacionadas forem as pessoas entre si, mais intensa se
manifestará essa paixão.
1) SÃO TOMÁS DE AQUINO, op. cit., II-II, q.36, a.1.
2) Idem, ad 2.
Mons João Clá Dias - Texto extraído do "O inédito sobre os Evangelhos" vol II
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